terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Os olhos da Carolina

Há alguns anos atrás, minha mãe ficou doente.
Sua doença começou a se manifestar mais ou menos na mesma época em que eu engravidei do meu primeiro filho, o Luigi.
Sou a filha caçula de 9 irmãos e uma mulher depois de 4 homens seguidos. Sempre fui muito amada, paparicada e alisada pela minha mãe.
Quando meu filho nasceu, minha mãe não pode dar a ele o colo que eu sei que ela gostaria de ter dado, nem pode me ajudar tanto quanto ela gostaria de ter me ajudado.
Ela fez o que pode, e o que ela pode fazer era muito mais do que eu precisava.
Eu só precisava dela.

Após 2 anos, a doença da minha mãe, que nenhum médico descobria qual era, havia progredido e nesse momento eu engravidei pela segunda vez.
Ela veio ficar comigo, mas ela não estava bem. Culpo-me até hoje por ter permitido que ela viesse; eu deveria ter dito a ela que não precisava, que eu ficaria bem. Mas a verdade é que, no fundo, eu precisava dela perto de mim, mesmo ela não estando bem. Ela me deixa segura.

Da mesma forma que da primeira vez, minha mãe não pode dar ao meu segundo filho o colo que eu sei que ela gostaria de ter dado e nem pode me ajudar da forma como eu sei que ela gostaria de ter ajudado.
Sua doença não havia sido diagnosticada ainda e ela, gradativamente, piorava.

Minha mãe sempre foi para mim o ponto central de minha vida, sua voz sempre foi musical e doce, sua presença certeira e constante e seus olhos, vigilantes.
Eu tive na minha mãe todo o amor dessa vida. Ela cuidou de mim, me beijou, me cobriu, me ensinou e me amou mais do que qualquer outra pessoa jamais me amou.
Quando criança eu mal conseguia me afastar dela por algumas horas...eu tinha saudade dela, eu pedia por ela.

Depois de algum tempo, e após passar por vários médicos, minha mãe piorou muito, exatamente em um feriado em que estávamos, todos os irmãos, na casa dela e do meu pai, no interior. Decidimos, naquela hora, trazê-la para São Paulo e interná-la no Einstein, para um batelada de exames, na esperança que um grupo de médicos pudesse descobrir o que ela tinha.

Alguns irmãos vieram a São Paulo para organizar a internação e eu fiquei com ela em Pira, incumbida de arrumar a mala dela para a viagem.

Por quantos anos eu viver eu não serei capaz de esquecer do medo que me invadiu ao mexer em seu armário para separar suas roupas. A cada blusa, a cada camisola, a cada peça de roupa que eu tocava, eu me despedia, mesmo que sem querer, da minha mãe...e isso me amedrontava, isso me fazia chorar.
A mesma saudade que sentia quando criança me invadiu, porém tive medo de ser uma saudade que eu não pudesse mais matar.
Enquanto isso, ela, deitada na cama, me vigiava, com seus olhos...os olhos da Carolina. E com seus olhos ela sorria, um sorriso triste, sem medo de morrer, mas com receio de que eu sofresse, por me ver ainda tão imatura para enfrentar o mundo sem ela, para criar meus filhos sem ela.
Seus olhos sempre me acompanharam e não deixaram de fazê-lo nem nessa hora.

A doença da minha mãe foi diagnosticada, ela foi tratada e hoje está bem.
Eu ainda tenho muito medo de perdê-la, eu ainda não estou preparada. Não creio que estarei um dia.
Eu digo a ela que a amo, digo isso a toda hora.
Quero-a perto de mim sempre. Quero seus olhos me vigiando. Os olhos da Carolina. E eles são lindos!

3 comentários:

Anônimo disse...

é interessante ler ¨Os olhos da Carolina ¨ ...tive uma experiência bem parecida com essa , é muito dificíl vc sentir que uma das pessoas que vc mais ama começa à se apagar .
...os olhos falam mais que á alma!
o texto ficou leve...é agradável!
Nilton Bergue.

Anônimo disse...

Ai, Fá... chorei.
Graças a Deus D. Carolina tá ótima. E você também.

Anônimo disse...

", eu arrancarei teus olhos e os colocarei no lugar dos meus, e tu arrancarás meus olhos e os colocará no lugar dos teus, e então eu te olharei com teus olhos e tu me olharás com os meus - "