domingo, 22 de março de 2009

CJK

Estou em Pirassununga. Estou escrevendo de Pirassununga, da casa dos meus pais.
Como sempre faço quando venho para Pira, corri muito nas ruas da cidade, ouvindo meu Ipod e suando muito (adoro!!!!) e visitei a Lelê e sua família. Dessa vez fomos todas tomar sorvete.
Como sempre, o Luigi, meu filho mais velho, me acompanhou nas minhas saídas. À exceção de quando saio para correr, ele sempre vai comigo a todos os lugares. Ele gosta de sair comigo, só nós dois; ele gosta que eu conte histórias de quando eu morava em Pira, ele gosta de participar da minha vida.

Ontem, após deixarmos a família da Lelê em casa, depois de termos tomado sorvete, fomos dar uma volta de carro, eu e o Lui.
Como sempre, senti-me impelida a passar em frente ao Kennedy, colégio onde estudei praticamente toda minha vida escolar pirassununguense.
Comentei com o Luigi que eu queria ver se era verdade mesmo que haviam pintado o colégio, eliminando sua cor clara original para um rosa amarronzado de gosto duvidoso (eu já sabia que haviam feito isso, mas pareceu-me o pretexto perfeito para passar por lá).

Realmente, meu colégio está parecendo um carro alegórico de uma escola de samba.
Eu não gostei, mas provavelmente eu não gostaria de nenhuma cor que não fosse a sua cor original, com a qual sua imagem fixou-se em minha memória.
Eu também não gostei quando construíram um novo prédio dentro do terreno da escola (mudando assim sua arquitetura original e seus espaços internos), eu também não gostei quando cimentaram o chão de terra batida e grama original (mudando assim o cheiro do meu colégio).

Porém, também mudaram os portões de acesso à entrada principal da escola. Antes, eram portões muito fechados, através dos quais pouco se enxergava. Como estou em Pirassununga apenas aos finais de semana, nunca podia ver minha escola por dentro, em função dos portões estarem sempre fechados.

Porém ontem, ao passar por lá com o Luigi, percebi que os novos portões permitem uma visão interna bem interessante. Sendo assim, parei o carro, grudei o nariz nos portões, assim como o Lui, e passei a contar para o meu filho onde ficavam as minhas classes de 1°, 2° e 3° colegial. Mostrei a escadaria por onde eu subia para a aula todos os dias, o pátio onde conversavamos e tomavamos nosso lanche (e fumavamos o nosso cigarro, antes da proibição de fumar dentro do colégio. Fumavamos muito, eu, que hoje nem fumo...mas fui uma adolescente dos anos 80 e toda a minha trupe fumava. Fumava-se nos anos 80).

Mostrei o banheiro, onde arquitetei planos mirabolantes para dar conta das coisas erradas que eu sempre queria fazer (fui uma aluna muito boa no que diz respeito às notas, mas meu comportamento passava longe do que poderia chamar-se de exemplar).

Mostrei as árvores e suas sombras, nas quais conversava sobre rock and roll, sempre. Em um tempo onde não havia Ipods, MP3s, celulares, internet, baixadores de música e nem CDs, carregávamos nossos LPs com todo cuidado e os reproduzíamos em fitas K7, para ouvirmos dentro dos carros da nossa turma.
Eu era a gravadora oficial de fitas K7, graças à minha invejável coleção de discos.

Mostrei a quadra, onde me acabava de jogar vôlei e queima, onde quebrei meu braço fugindo de um ataque mais violento em um jogo.

Mostrei ao Luigi minhas lembranças, talvez as melhores que tenho dessa época.

Mostrei a ele as lembranças de uma adolescência muito questionadora, mas também muito saúdável. Pois minha adolescência foi passada entre bons livros, bons discos, bons filmes, bons professores e boa informação. Nós líamos muito, isso é verdade.

E toda essa informação me permitia questionar, rebelar, transgredir.
Porque os adolescentes são feitos desse material.
E nesse material eu fui forjada. E esse material meu colégio me deu.

E hoje ainda, esse colégio me permite, através das minha lembranças, criar um vínculo inquebrável com meus filhos, pelas histórias contadas, pelas lembranças partilhadas.

domingo, 15 de março de 2009

Tia Yvonne

Como eu já disse várias vezes, eu gosto muito de crianças. Mais do que gostar até, eu me emociono com elas e com seu universo. Para mim, as crianças são as verdadeiras razões da vida, a única pureza genuína e tocante que conheço.
Os melhores adultos do mundo, no meu parecer, são aqueles que conseguem manter, em suas almas, o olhar infantil.

Crianças são minha paixão. Brancas, negras, pardas, amarelas, altas, baixas, meninos, meninas, ricas ou pobres.

Mas as crianças pobres tem minha especial atenção. E preocupação.
Tenho como objetivo de vida poder dedicar-me integralmente a elas.

Algumas pessoas dizem que quando tiverem criado seus filhos pretendem conhecer o mundo, ou criar animas em uma fazenda, ou ainda descansar em suas casas na praia...meu objetivo de futuro, no momento em que meus filhos estiverem criados, é dedicar-me às crianças pobres que precisarem de mim. Elas serão o mundo que quero conhecer, elas serão a fazenda que pretendo desbravar, elas serão minha casa na praia.

Há algum tempo atrás comecei a ler sobre uma mulher chamada Yvonne Bezerra de Mello.
A Yvonne é uma mulher carioca de classe alta que dedica sua vida às crianças pobres.
A Yvonne é aquela mulher que lutou pela condenação dos policiais envolvidos na Chacina da Candelária.
A Yvonne é aquela mulher que muitos chamam de louca e acusam de proteger bandidos, quando ela na verdade protege pequenas crianças, de forma que elas possam ter direito ao estudo e não se tornem bandidos. Dessa forma, a Yvonne protege também aqueles que nada fazem por essas crianças e ainda a criticam, pois a Yvonne tenta diminuir a marginalidade, fazendo com que seja possível que as peruas e os magnatas desfilem com suas jóias e carros importados sem serem perturbados pela pobreza, nos faróis e esquinas de suas cidades.
Assim eles podem desfilar suas posses sem ter que olhar suas próprias mazelas nos olhos infantis que os miram.
Podre consolo...podre ilusão!

A Yvonne tenta fazer com que essas crianças sejam vistas como as pessoas que realmente são, tendo acesso ao seu direito de ser criança, de ter estudo, de ter amor.
A Yvonne tem mais fracassos do que vitórias, porque o mundo é cruel e ele engole essas crianças. Ela perde a grande maioria delas para o tráfico e para a bandidagem, mas ela não desiste. Porque se ela consegue salvar uma, uma só, seu trabalho já é abençoado.

Eu quero ser como a Yvonne.

As crianças a chamam de tia Yvonne. Milhares de crianças vêem nela a fada boa.
Eu quero ser como ela.

Após muito ler sobre ela e sobre a fundação que ela criou no Rio de Janeiro, para apoiar e educar essas crianças (O Projeto Uerê), criei coragem e escrevi para ela. Mandei um email sem maiores pretensões, apenas parabenizando-a pelo trabalho, pela coragem e dedicação. Escrevi dizendo dos meus planos e do pequeno trabalho que atualmente faço em prol da infância marginalizada.
Escrevi a ela pedindo que não desista.

Ela respondeu-me após 10 minutos, dizendo : "Eu apareço em reportagens, mas somos todas nós que fazemos esse país andar para a frente."

Eu quero ser a tia Yvonne. E as crianças que precisarem de mim, me terão.

E através delas eu vou conhecer o mundo também, só que, diferentemente daqueles pessoas que viajam, eu vou conhecê-lo por dentro, podendo habitar o coração de cada criança que eu puder ajudar.
E esses corações, assim como os corações dos meus filhos, são o único mundo que eu quero conhecer.

sábado, 14 de março de 2009

Cacildis!

Das minhas lembranças de infância, que são vastas, variadas e maravilhosas, algumas tem especial significado para mim.
Fui uma criança que assistiu pouco televisão, porque fui criada no interior, em uma cidade calma e em uma casa com um quintal enorme e com uma piscina convidativa, portanto grande parte da minha infância foi passada nesse quintal, ou ainda na rua da minha casa, onde jogava vôlei, ou queima, ou brincava de esconde esconde com as minhas amigas.

Porém, quando o domingo chegava e a noitinha ia caindo, eu não perdia, por nada desse mundo, o programa "Os Trapalhões".

Eu amava! A musiquinha de abertura (presente na mente de gerações, tenho certeza), eu ainda cantarolo de vez em quando. As palhaçadas dos quatro manés me deixavam encantada, e não havia melhor programa de TV para mim do que esse.
Eu gostava em especial do Didi e do Mussum. Do Didi eu curtia principalmente o riso que ele provocava em seus companheiros, com suas piadas que não constavam no roteiro e que, então, pegavam a todos de surpresa.
E do Mussum eu gostava do riso solto, leve e fácil. Eu gostava da maneira como ele falava e da ginga de malandro carioca. Eu gostava dos bordões que ele usava ("quero morrer preto se eu estiver mentindo"- era o meu favorito) e da maneira como terminava as palavras (Cacildis, forevis, revólvis...).
Eu não só assistia ao programa como todo ano ia ao cinema assistir aos filmes que eles lançavam. O pai de uma grande amiga levava a mim e a ela todos os anos, invariavelmente. Hoje, olhando para trás, tenho a clara certeza que ele gostava tanto ou mais do que a gente, pois ele também era e é uma criança grande, o Seu Edgar.

Dia desses, meus filhos ganharam da minha irmã Raquel, 2 caixas com 10 filmes dos Trapalhões. Incrivelmente a genética foi infalível nesse caso e eles, que já haviam assisitido a alguns filmes deles, amam os 4, assim como eu.
Obviamente que eu aproveitei o belo presente para matar a saudade, e me diverti com meus filhos vendo todas aquelas bobagens divinas, aquela graça circense e aquele humor ingênuo.
E, meu Deus, como foi bom.

Emocionei-me verdadeiramente, ao lembrar-me da menina que fui e das risadas que dei (tantas!!!) com esses 4 palhaços.

Com olhos de adulta, pude perceber que, sem a patrulha ideológica que hoje existe, eles podiam fazer brincadeiras que hoje seriam consideradas politicamente incorretas, mas que, na época, não tiveram efeito ruim algum sobre mim (e estou certa que sobre ninguém). O único efeito que essas brincadeiras tinham sobre mim era de soltar meu riso infantil, minha gargalhada mais genuína.

E chego a pensar, e não é sem pesar, que fui uma criança criada em um mundo mais puro ou mais ingênuo do que o de hoje.

Ou talvez não e eu esteja enganada, mas o certo é que eu cresci vendo as brincadeiras desses santos trapalhões e, politicamente corretas ou não, elas só fizeram de mim uma criança feliz.