quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Contadoras de histórias

Até mais ou menos o final de minha adolescência, eu tive duas casas.
Uma delas, obviamente, era a casa de meus pais, onde fui criada. Até hoje, a casa de meus pais é meu porto seguro e minha base afetiva.

A minha segunda casa foi a casa da minha vó.
Eu era frequentadora assídua da casa da minha vó.
Passei manhãs, tardes e noites na casa da minha vó.
Eu podia ir sozinha, porque não precisava andar na rua para chegar até lá.
Meu pai construiu um portão que dava acesso à casa dela, por nosso quintal.

Eu gostava do cheiro da casa e gostava de ver a Bíblia Ilustrada descansando sobre a mesa, de frente à porta de entrada.
Eu gostava de ver o galinho português. Gostava sobretudo de estar perto delas, da minha vó Maria, da Dindinha e da Mina.
Mesmo quando tornei-me adolescente, não me distanciei. Continuei indo lá todos os dias, para conversar, ver novelas, tomar sopa, comer macarrão e cuzcuz e chupar balas de mel.

Lembro-me que uma das coisas que eu mais fazia, ao visitar minha vó, a Mina e a Dindinha, era ver o álbum de fotografias delas.
Era um álbum antigo, de capa de couro e com aquelas folhas de seda rugosa separando as páginas das fotos.
Cada foto era pregada no álbum por quatro pequenos triangulos de papelão rígido, que seguravam as fotos pelos seus ângulos.
Vi esse álbum inúmeras vezes.

Lá havia fotos da minha mãe, das minhas tias e do meu tio quando crianças.
Havia fotos de pessoas que eu nunca conheci, mas cresci ouvindo seus nomes.
Lá havia fotos de meu avô Antônio, pai da minha mãe, que ela mal conheceu, porque ele morreu muito cedo...nós não o conhecemos, mas carregamos suas sobrancelhas.

Graças às fotos, pude ter na minha mente a fisionomia de meu avô. Ele é pai da minha mãe, portanto, como eu poderia ignorar seu rosto?
Meu avô português que nos deixou de herança esse sangue mouro, que todos nós carregamos.

Gosto de fotos desde sempre.
Adoro vê-las, vasculhar caixas ou álbuns antigos, recheados delas.
Não me canso de olhá-las.
Na minha bolsa, sempre há uma máquina fotográfica.
Um dos meus grandes prazeres é fotografar.

Fotografo os meus filhos fazendo tudo e qualquer coisa. Adoro registrar seus rostinhos.
Também gosto de fotografar momentos especiais com meus pais. Quero guardar meus pais para sempre. As fotos, de alguma forma, me permitirão isso.

Gosto de fotografar Pirassununga. Gosto de tornar perene a imagem de seus ipês, suas sibipirunas, suas casas antigas e prédios de época.
Gosto de fotografar suas ruas.
Ando sozinha pela cidade e vou fotografando. Varandas de casas, calçadas repletas de floradas que despencaram das árvores, suas crianças que podem brincar na rua...fotografo tudo, orgulhosamente.

A fotografia tem alma e conta uma história, para quem se interessar em ouví-la.
Foi um prazer que consegui identificar há pouco.
Nunca pensei que pudesse ter tanto prazer em algo tão simples.

Mas eu adoro. Saio pelas ruas e vou fotografando. Tudo pode ser interessante, só depende dos olhos de quem enxerga.
Vou fotografando e entendendo.

Entendendo porque aquela menininha de 7 anos, que eu fui um dia, sentava-se na sala da casa da minha vó, com os pés mal encostando no chão, segurava o velho álbum de fotos e pela enésima vez, sentia-se feliz com aquilo.

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